Antes que a gente descubra que é gente, na nossa casa já existe uma prateleira, guardada num lugar longe dos olhos curiosos, mas ao mesmo tempo um lugar prático, sempre ao alcance das mãos - porque hoje somos feitos de pressa e desejo.
Assim como a gente aprende a chamar as coisas pelos nomes que lhes foram dados, ou aprende a comer com garfo e faca, ou a ler as horas toda vez que estivermos com pressa, aprendemos também, com a mesma automaticidade, a visitar a prateleira quando acreditamos ser preciso. Acontece em segundo (fomos muito bem treinados). Sempre que uma conversa começa, você se posiciona em frente a inúmeras latas, empilhadas na perfeita lógica, feita especialmente para que você gaste o menor tempo possível esticando o braço para alcançar a que lhe será útil no momento apropriado.
São empilhadas com tamanha inteligência que, ao passo que você cresce, novas latas vão sendo reveladas ao longo da prateleira: depois da lata "Chorar Quando Estiver Com Fome" e da lata do "Quando Quiser Ir Ao Banheiro, Pedir Ajuda À Mamãe" aparece a lata do "B + A = Bá". Assim seguem as fileiras dos discursos, onde se aprende o que é azul e o que é vermelho, e onde se aprende que roupinhas rosa são pra crianças (que ainda nem sabem a diferença entre menino e menina) do sexo feminino.
Na maior parte das vezes, ninguém te conta o que tem dentro da lata. Aponta-se com o dedo e o esperado é que você mesmo a abra. Lá estão as latas iguais as que seus pais abriram quando tinham a sua idade. O que ninguém te aponta é o fundo da prateleira. Há quem até diga o mito de que lá no fundo tem teias de aranhas em tamanhos colossais, ratos do tamanho de gatos, escorpiões e todas as espécies dos menores e mais assustadores bichos. Na primeira fileira, tem inclusive uma lata sobre as latas do fundo. Quando você quiser, é só esticar o braço, abri-la e prosseguir por aí, contando a todos como lá é escuro e perigoso. Mas, na maior parte das vezes, nada sobre aquele lugar da prateleira é revelado - dá pra ter uma ideia, depois que você já tiver aberto a lata da lógica, que pra chegar lá você já deverá ter aberto muitas e muitas latas.
Os adultos, pelo menos do meu tempo, param em determinada fileira de latas. Muitos por medo do mistério das latas de trás, e muitos (muitos mesmo) por confundirem a sobra projetada nas Latas dos Mistérios com o fim da prateleira de latas - veja só que bobagem!
Pois então: há os Aventureiros. Aqueles que um dia estenderam os braços para pegar a lata que lhe convinha e EUREKA: "E se eu deixar essa lata cair?" A partir daí, os Aventureiros passaram a derrubar as latas propositalmente, porque descobriram que poderiam fazer suas próprias latas. Fileiras da frente caídas, passaram a abrir novas latas, muito mais polidas e recheadas, que davam sede infinita de abrir novas latas e essas latas - imagina só - tinham instruções de como fazer nossas próprias latas e de como presentear as pessoas queridas com nossos próprios discursos, feitos sob medida!
Mas tem gente que se apega as latas da frente. E nós, os Aventureiros, até entendemos que elas são mais fáceis, e que é muito mais fácil abri-las e distribuí-las, afinal, funcionou com os nossos pais... Mas nós vimos tantas coisas melhores! Novos discursos, muito mais apropriados à capacidade dos nossos cérebros, muito mais adequados à nossa inteligência, mais humanos e mais saudáveis à mente e à sociedade em que a gente vive.
Só te custa derrubar alguns desses discursos enlatados, industrializados em latas já enferrujadas, impróprias, corroídas e corrosivas à nossas mentes e corpos - tão mais capazes, tão pouco aproveitados...
Que tal fazermos nossas próprias latas?
E a receita pra isso é bem simples. É só a gente parar pra pensar. Pesquisar, conhecer novos ambientes, novas leituras, novas pessoas, novos discursos. Eu mesma já fiz e refiz meu discurso, sempre tentando melhorá-lo... Só me bastou coragem. Então, tô aqui pra te encorajar. Enquanto alguém não te provocar, é provável que você não perceba como tem se feito mal - e feito mal às pessoas à sua volta - com coisas que você nem percebe que falou ou fez. Por favor, pare pra pensar no que você fala. Não por mim, mas por você. Pelas pessoas a quem você ama. Pelas pessoas que, no futuro, pisarão na mesma terra que você. Queira pra eles um mundo melhor, como o que eu quero pra nós. Sejamos mais humanos, sem esse software de repetição, porque tá nocivo, já.
Pensemos mais.
Assim como a gente aprende a chamar as coisas pelos nomes que lhes foram dados, ou aprende a comer com garfo e faca, ou a ler as horas toda vez que estivermos com pressa, aprendemos também, com a mesma automaticidade, a visitar a prateleira quando acreditamos ser preciso. Acontece em segundo (fomos muito bem treinados). Sempre que uma conversa começa, você se posiciona em frente a inúmeras latas, empilhadas na perfeita lógica, feita especialmente para que você gaste o menor tempo possível esticando o braço para alcançar a que lhe será útil no momento apropriado.
São empilhadas com tamanha inteligência que, ao passo que você cresce, novas latas vão sendo reveladas ao longo da prateleira: depois da lata "Chorar Quando Estiver Com Fome" e da lata do "Quando Quiser Ir Ao Banheiro, Pedir Ajuda À Mamãe" aparece a lata do "B + A = Bá". Assim seguem as fileiras dos discursos, onde se aprende o que é azul e o que é vermelho, e onde se aprende que roupinhas rosa são pra crianças (que ainda nem sabem a diferença entre menino e menina) do sexo feminino.
Na maior parte das vezes, ninguém te conta o que tem dentro da lata. Aponta-se com o dedo e o esperado é que você mesmo a abra. Lá estão as latas iguais as que seus pais abriram quando tinham a sua idade. O que ninguém te aponta é o fundo da prateleira. Há quem até diga o mito de que lá no fundo tem teias de aranhas em tamanhos colossais, ratos do tamanho de gatos, escorpiões e todas as espécies dos menores e mais assustadores bichos. Na primeira fileira, tem inclusive uma lata sobre as latas do fundo. Quando você quiser, é só esticar o braço, abri-la e prosseguir por aí, contando a todos como lá é escuro e perigoso. Mas, na maior parte das vezes, nada sobre aquele lugar da prateleira é revelado - dá pra ter uma ideia, depois que você já tiver aberto a lata da lógica, que pra chegar lá você já deverá ter aberto muitas e muitas latas.
Os adultos, pelo menos do meu tempo, param em determinada fileira de latas. Muitos por medo do mistério das latas de trás, e muitos (muitos mesmo) por confundirem a sobra projetada nas Latas dos Mistérios com o fim da prateleira de latas - veja só que bobagem!
Pois então: há os Aventureiros. Aqueles que um dia estenderam os braços para pegar a lata que lhe convinha e EUREKA: "E se eu deixar essa lata cair?" A partir daí, os Aventureiros passaram a derrubar as latas propositalmente, porque descobriram que poderiam fazer suas próprias latas. Fileiras da frente caídas, passaram a abrir novas latas, muito mais polidas e recheadas, que davam sede infinita de abrir novas latas e essas latas - imagina só - tinham instruções de como fazer nossas próprias latas e de como presentear as pessoas queridas com nossos próprios discursos, feitos sob medida!
Mas tem gente que se apega as latas da frente. E nós, os Aventureiros, até entendemos que elas são mais fáceis, e que é muito mais fácil abri-las e distribuí-las, afinal, funcionou com os nossos pais... Mas nós vimos tantas coisas melhores! Novos discursos, muito mais apropriados à capacidade dos nossos cérebros, muito mais adequados à nossa inteligência, mais humanos e mais saudáveis à mente e à sociedade em que a gente vive.
Só te custa derrubar alguns desses discursos enlatados, industrializados em latas já enferrujadas, impróprias, corroídas e corrosivas à nossas mentes e corpos - tão mais capazes, tão pouco aproveitados...
Que tal fazermos nossas próprias latas?
E a receita pra isso é bem simples. É só a gente parar pra pensar. Pesquisar, conhecer novos ambientes, novas leituras, novas pessoas, novos discursos. Eu mesma já fiz e refiz meu discurso, sempre tentando melhorá-lo... Só me bastou coragem. Então, tô aqui pra te encorajar. Enquanto alguém não te provocar, é provável que você não perceba como tem se feito mal - e feito mal às pessoas à sua volta - com coisas que você nem percebe que falou ou fez. Por favor, pare pra pensar no que você fala. Não por mim, mas por você. Pelas pessoas a quem você ama. Pelas pessoas que, no futuro, pisarão na mesma terra que você. Queira pra eles um mundo melhor, como o que eu quero pra nós. Sejamos mais humanos, sem esse software de repetição, porque tá nocivo, já.
Pensemos mais.
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